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Síndrome de Burnout

Burnout pode implicar no aumento dos tributos das empresas

18/01/2022
Homem sentado na cadeira com a mão no rosto

Entenda como essa nova doença ocupacional impacta nos resultados de SST.

A síndrome do esgotamento profissional, conhecida como Burnout, já é categorizada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como doença ocupacional, ou seja, doença que o trabalhador adquire em razão da sua atividade profissional. Com essa nova classificação, o direito de afastamento reconhecido pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) será facilitado.

A concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez por transtornos mentais e comportamentais somou 576,6 mil afastamentos em 2020, um recorde com 26% de alta em relação a 2019, segundo dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho. Talvez uma exclusividade do ano pandêmico, talvez uma amostra de um possível mal do século, que as empresas precisam dar atenção.

Sintomas do Burnout

O Burnout é caracterizado inicialmente pela hiper produtividade, levando a uma sensação de esgotamento e sentimentos negativos relacionados ao trabalho. Os sintomas que aparecem no decorrer desse processo inicial incluem:

  • Fadiga crônica
  • Falta de energia
  • Aumento da distância mental do serviço
  • Negativismo relacionado ao trabalho
  • Redução de eficiência profissional
  • Insônia
  • Esquecimento
  • Dificuldade de concentração e atenção
  • Dores físicas
  • Pessimismo
  • Isolamento
  • Apatia e desesperança
  • Irritabilidade excessiva

Muitas vezes, evolui para doenças psiquiátricas como a depressão e as perturbações de ansiedade, o que reforça a necessidade de se prevenir e intervir precocemente.

De acordo com o Médico do Trabalho Dr. Paulo Henrique Costa, que atualmente atua em empresas do ramo de mineração, alimentação e tecnologia, a Síndrome de Burnout, na Medicina Ocupacional, pode ser identificada de diversas formas:

“Sabe-se que o bem-estar físico e mental é fator fundamental para o bom desempenho e desenvolvimento das atividades laborativas e até mesmo de lazer. Mas, do ponto de vista ocupacional, é frequente que alguns empregados apresentem um aumento da entrega de atestados de afastamento com queixas iniciais de irritabilidade, indisposição, esgotamento mental, falta de prazer em ir ao trabalho, perda de sono, reclamações por motivos fúteis, falta de concentração e em casos mais críticos com doenças hipertensivas, síndrome do pânico e depressão”.

Ele acrescenta ainda que outra característica a ser observada é o presenteísmo, ou seja, o empregado está fisicamente presente no trabalho, mas mentalmente ausente e improdutivo. 

Treinar os gestores para identificar estes desvios em sua equipe é fundamental para abortar este processo e resgatar o compromisso e autoestima do empregado. Outro ponto importante é o suporte, por parte das empresas, através de apoio psicológico, tão fundamental para o resgate da autoestima e valorização do colaborador enquanto ser humano, evitando que ele entre em uma espiral negativa e saia mais fortalecido deste processo.”, completa Paulo Costa.

CID – Classificação Internacional de Doenças 

A Síndrome de Burnout tem agora uma nova classificação, o CID 11. A Classificação Internacional de Doenças é uma das principais ferramentas epidemiológicas que monitora a incidência e a prevalência das enfermidades. Em 1º de janeiro de 2022 entrou em vigor a CID 11, que incluiu gaming disorder (distúrbio em jogos eletrônicos), resistência antimicrobiana, transexualidade, autismo e a Síndrome de Burnout, que faz parte de um capítulo muito específico na classificação internacional, relacionado aos problemas gerados e associados ao trabalho.

Na CID 11, a Síndrome de Burnot se encontra no capítulo 24, sob o código QD85, enquanto na CID 10 se encontra no capítulo 11, sob o código Z73. “Na classificação atual, a caracterização da Burnout fica mais clara e assertiva, estando ligada a um contexto ocupacional, excluindo experiências em outras áreas da vida. Indicando ser consequente de um estresse crônico decorrente de um processo de gerenciamento laboral deficiente”, diz Paulo.

Nesta última classificação, o CID 11, há uma “subdivisão” em 3 dimensões: 

  1. Sentimentos de exaustão ou esgotamento de energia; 
  2. Aumento do distanciamento mental do próprio trabalho ou sentimentos de negativismo ou
  3. Sensação de ineficácia e falta de realização.

Paulo Costa explica ainda que é preciso ficar atento, pois a Síndrome de Burnout não representa transtornos de ajuste; distúrbio especificamente associado ao estresse; transtornos relacionados à ansiedade ou medo e transtornos do humor.

Essa enfermidade, muito ligada ao estilo de vida moderno, não foi incluída no capítulo que trata dos transtornos mentais, comportamentais ou do neurodesenvolvimento, já que para a OMS trata-se de uma síndrome resultado do estresse crônico no local de trabalho.

Incapacidade para o trabalho

Caso o funcionário procure a justiça por problemas associados ao trabalho, a empresa poderá ser responsabilizada. Para isso, podem ser coletadas provas, como assédio moral, metas fora da realidade ou cobranças agressivas.

Essa mudança de classificação serve como um alerta muito significativo para as empresas, não só pela forma como a produtividade e os processos têm sido exigidos dos colaboradores quanto ao acúmulo de funções, horas extras e cobranças, mas pelos prejuízos financeiros decorrentes desses afastamentos.

O INSS pode reconhecer que o afastamento do empregado se deu por doença do trabalho ou qualquer condição decorrida ou agravada pelo trabalho, o enquadrando no termo B91. Dessa forma, pode conceder o benefício do auxílio-doença em casos de incapacidade temporária, e que pode garantir estabilidade de 12 meses de emprego ou aposentadoria por invalidez. Após 15 dias do trabalho com atestado médico, é possível que o trabalhador afetado peça pela realização de perícia do INSS.

“Da forma em que está, do ponto de vista ocupacional, o enquadramento do Burnout no B91 fica mais coerente e dá mais segurança ao processo de diagnóstico. Contudo, é necessário ter atenção, pois a relação com a atividade deve ser muito bem estabelecida e depende do conhecimento adequado do profissional e retidão das informações prestadas pelo empregado”, alerta Paulo.

A pandemia de Covid-19, além de diversas outras consequências, tem contribuído para um aumento da Síndrome de Burnout em profissionais de saúde. Segundo um estudo realizado pela PEBMED, a prevalência do Burnout é de 83% nos médicos que estão na linha de frente, e 71% naqueles que não estão atuando no combate ao novo coronavírus. Porém, antes mesmo da pandemia, pesquisas mostram altas taxas de Burnout em residentes de pediatria, superiores a 50%, com fatores associados a estresse, sonolência, qualidade de vida, atenção plena, autocompaixão, empatia, confiança na prestação de cuidados compassivos, estar em rotatividade de alta acuidade, erro médico grave recente, folga recente, satisfação com o suporte e a escolha de carreira, e atitudes em relação à residência.

Responsabilidade da empresa

O médico do trabalho diz que em relação aos profissionais que trabalham em mais de uma empresa, com extensão de jornada, em turnos e sob o regime CLT, fica extremamente difícil a caracterização como B91, pois saber qual empresa foi a principal causadora do evento é praticamente impossível; daí a importância de uma abordagem médica extremamente adequada, com o objetivo de determinar a real causa(s) de Burnout e até mesmo indicar que o empregado renuncie a uma ou outra atividade em benefício de sua própria saúde.

A título de exemplo, os médicos podem ser profissionais liberais, atuando com autonomia para mais de um contratante. Entretanto, como estabelecer um vínculo judicialmente responsável em caso de uma doença decorrente do trabalho?

Apesar das visíveis jornadas extenuantes dos profissionais liberais, principalmente na área de saúde, infelizmente é muito difícil provar juridicamente esta relação de causalidade, a não ser que ele tenha algum vínculo CLT e que consiga provar a ligação direta desta atividade como causa da sua doença”, explica Paulo Costa.

Em todo processo de caracterização de doença ocupacional é necessário observar o Art. 2º da RESOLUÇÃO CFM Nº 2.183/2018 que revogou a Resolução CFM Nº 1488/1998.

“…Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além da anamnese, do exame clínico (físico e mental), de relatórios e dos exames complementares, é dever do médico considerar:

I – a história clínica e ocupacional atual e pregressa, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;

II – o estudo do local de trabalho;

III – o estudo da organização do trabalho;

IV – os dados epidemiológicos;

V – a literatura científica;

VI – a ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhadores expostos a riscos semelhantes;

VII – a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;

VIII – o depoimento e a experiência dos trabalhadores;

IX – os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde.

Parágrafo único. Ao médico assistente é vedado determinar nexo causal entre doença e trabalho sem observar o contido neste artigo e seus incisos…”

O Dr. Paulo nos explica que as diretrizes acima, juntamente com uma boa abordagem ocupacional aliada ao interesse do empregado em sair da situação indesejada, implicará em sucesso na caracterização ou descaracterização e resolução da sua condição de saúde.

Prejuízos para o empregador

Um ponto importante que as empresas precisam estar atentas e que a grande maioria não sabe é quanto ao FAP – Fator Acidentário de Prevenção. O FAP varia anualmente e é um multiplicador aplicado sobre alíquotas de 1%, 2% ou 3% da tarifação, incidentes sobre a folha de salários das empresas para custear aposentadorias especiais e benefícios decorrentes de acidentes de trabalho. Ele é calculado sempre sobre os dois últimos anos de todo o histórico de acidentalidade e de registros acidentários da Previdência Social.

As empresas que registram maior número de acidentes ou doenças ocupacionais pagam mais, enquanto a bonificação aumenta para empresas que registram acidentalidade menor. No caso de nenhum evento de acidente de trabalho, a empresa é bonificada com a redução de 50% da alíquota.

É interessante entender que, uma vez que um funcionário completa seu 15º dia afastado pelo INSS, esse número passa a ser contabilizado no registro de acidentalidade da empresa e por apenas um único evento e/ou um dia a mais afastado do trabalho, a empresa pode ter um prejuízo financeiro de dezenas – até centenas! – de milhares de reais.

“A partir do momento que ocorrer a caracterização de Burnout em algum empregado, comprovando o nexo ocupacional e/ou NTEP (Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário), haverá impacto no FAP das empresas em se tratando de doença ocupacional.  Com isto, mais uma vez, há que se valorizar o acompanhamento ocupacional coerente com profissionais competentes e uma abordagem adequada, para assim equalizar o resultado como mais correto possível, evitando penalizar qualquer uma das partes envolvidas.”

As empresas que não acompanharem devidamente as relações de trabalho entre seus colaboradores e seus processos, terão que lidar também com prejuízos como redução de produtividade, custo de seleção, contratação e treinamento de novo colaborador e custas judiciais. O médico Paulo Costa conclui dizendo que é preciso estabelecer uma relação de confiança entre empregado, empresa, saúde ocupacional, INSS e sindicatos.


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